Homilia de Corpus Christi / Frei João Santiago
Corpus Christi
A Igreja hoje celebra a festa do Corpo e Sangue de Cristo. Jesus presente em forma de alimento. Corpo e Sangue de Jesus Cristo presente no pão, nas pessoas.
A origem da festa. Um sacerdote se perguntou: “Será mesmo que o Corpo e Sangue de Cristo se encontram em um pedaço de pão?” Durante uma missa ele obteve a resposta porque quando partiu o pão, um pouco de sangue escorreu da pequena hóstia. Desde 1264 a festa se faz em toda a Igreja como manifestação pública da nossa fé.
Devemos lembrar que quando Jesus instituiu a Eucaristia sabia que tinha as horas contadas. E aí preparou o seu “adeus” durante um banquete, sua despedida em forma de testamento, sua “última vontade”. Qual será a marca que Ele quis nos deixar ao instituir a santa Eucaristia? Qual o sinal para identificá-Lo?
Lembremos dos banquetes de Jesus: pobres, aleijados, publicanos, mulher pecadora, etc. participavam. A mesa de Jesus era a mesa do amor incondicional. Celebrar o “corpo de Cristo” é jamais esquecer que Jesus se fez alimento e que a comunidade cristã não pode esquecer dos outros banquetes de Jesus nos quais os necessitados no corpo e na alma se achegavam.
Jesus disse: “Tomai todos e comei ... bebei”: o corpo, o sangue, o “eu, a pessoa do cristo é para ser assimilado até mexer e “complicar” nossa vontade, liberdade, opções. Quem comunga não deixe restos de hóstia na mão: que se assimile todo o Cristo, não só uma parte; que aquele que comunga se torne um dom, um alimento, faça da vida uma doação sem reservas. E isso porque comungou Aquele que também sem reservas se dou, se fez alimento, não retendo nada, amando até não poder mais.
Meus irmãos e irmãs, a marca de Cristo é essa: partir-se, distribuir-se, fazer-se alimento: “Tomou o pão, partiu, deu graças, e disse: acolhei-me, comei, bebei, assimilai-me”. A marca de Cristo, a marca de um que fez de sua vida uma doação até não poder mais. O corpo de Cristo não é para ser “adorado”, mas para ser deglutido, feito meu, entrar no meu corpo, entrar no meu eu, mexer na minha vontade, sentimentos, atitudes, liberdade.
Por quê o pão como símbolo maior da marca de Cristo? Posso destruir o outro como quando se devora um pedaço de pãO (cf. Deuteronômio 7:16, quando diz ao povo de Israel: “comerás todos os povos que o Senhor, teu Deus, te der). Devoro o outro, vivo como um sanguessuga, uso a fraqueza do outro para o meu deleite. Os nacionalismos, as seitas, os partidos, as “panelinhas” fazem isso, pois sempre menosprezam os outros para se sentirem os “tais”. Mas o pão, o alimento também foi sempre usado como sacrifício. Aqui eu me nego a devorar o outro e dou o deleite ao Senhor: a ele o pão (Gn 18, 5-6). O pão é símbolo da vida, do que me faz viver e Jesus “sabia” que uns procuram a vida esmagando outros, fazendo do outro o próprio pão. Que regozijo se desfruta quando se destrona um inimigo!!! Dizendo: “Tomai todos e comei” é como se dissesse: “Parem de se digladiarem, parem de usar os outros para todos os tipos de prazeres egoístas, parem de se matarem, parem de se fazerem mal uns aos outros e..... se alimentem de mim. Por que buscar água em cisternas rachadas? Se vocês não comerem a carne do Filho do Homem não terão a vida em vós, pois a minha carne é verdadeira comida e meu sangue verdadeira bebida. Parem de se verem como uma potencia que só tem apetite e que só se satisfaz comparando-se e vencendo os outros, e se descubram, alimentando-se de mim, como um dom, como pessoas que tem a vida e vida em abundancia: basta que escutem: “Tomai todos e comei: isto sou eu”.
"Eu sou o pão da vida. 49.Vossos pais, no deserto, comeram o maná e morreram. 50.Este é o pão que desceu do céu, para que não morra todo aquele que dele comer. 51.Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão, que eu hei de dar, é a minha carne para a salvação do mundo.
O pão, como alimento, mantém a vida e precisa ser comido. E como o homem não vive só de pão, mas de toda Palavra..., a Palavra precisa, também, ser comida.
"Filho do homem, falou-me, come o rolo que aqui está, e, em seguida, vai falar à casa de Israel. Abri a boca, e ele mo fez engolir. Filho do homem, falou-me, nutre o teu corpo, enche o teu estômago com o rolo que te dou. Então o comi, e era doce na boca, como o mel” (Ez 3, 1-3).
Jesus se identifica como “a Palavra”, não como o pão no deserto, e quem se alimenta dele... não morre, possui a vida eterna.
Que nós vivamos do seu pão, do seu corpo, do seu Eu”, da sua “pessoa”. Corpo de um Filho do Pai e irmãos de todos, dado ao Pai e ao irmãos. Corpo de um Filho, corpo animado pelo amor? Quando celebramos a Eucaristia torna evidente o sentido da vida de Jesus: sua vida, seu corpo em oferenda.
52.A essas palavras, os judeus começaram a discutir, dizendo: Como pode este homem dar-nos de comer a sua carne? 53.Então Jesus lhes disse: Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos. 54.Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia. 55.Pois a minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue, verdadeiramente uma bebida.
Comer, crer, assimilar, colocar para dentro de nós a humanidade de Jesus a fim de ter a vida. Como ele viveu para que eu possa “digeri-lo”, crer, assimilar, colocar para dentro? Eu, escutando a Palavra do Filho, a minha inteligência se liga à sua e ganho a mentalidade do Filho. Com a nova mentalidade do Filho como passarei a pensar, valorar, ajuizar? Quais serão meus critérios. Que farei dos meus sentimentos ligados aos sentimentos de Cristo? De quem será o meu coração, o meu amor? Certamente que tendo o coração do Filho, terei comunhão com o Pai e com os irmãos.
Comungamos o corpo de Cristo. O quê e como viveu aquele (este) corpo? Certamente viveu como “oferenda”, também à minha pessoa, e entro em comunhão com Ele digerindo-o, assimilando-o em mim. E, assim, tenho sua vida (sangue) e seu Espírito através do seu corpo.
56.Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele.
É bem verdade: organizamos nossa vida a partir do nosso objetivo maior, a partir do nosso amor maior. O Evangelho fala de um permanecer recíproco, assim como um se torna a vida do outro. O outro é a minha vida e eu sou a vida dele. Comungar é dizer que o Filho se torna a minha vida. Se o Filho deu a vida por mim, então eu sou a vida dele. Que o Senhor se torne a minha casa e eu a casa dele. Que o Outro habite em mim.
57.Assim como o Pai que me enviou vive, e eu vivo graças ao Pai, assim também aquele que comer a minha carne viverá graças a mim. 58.Este é o pão que desceu do céu. Não como o maná que vossos pais comeram e morreram. Quem come deste pão viverá eternamente."
Se um pessoa se alimenta da carne de Cristo, assimilando o Cristo nela, acontece algo novo na vida dela. A pessoa começa a fazer parte da vida trinitária e finalmente descobre sua verdadeira identidade: filho do Pai, irmão do Filho e dos irmãos.