Frei Jorge na sacada da Basílica ao meio-dia, rezando o Ângelus, como tem feito diariamente após o fechamento das igrejas
Diante da pandemia de novo coronavírus (Covid-19), que causou o fechamento de comércios, escolas e igrejas em todo o país, agora as missas celebradas diariamente no Santuário Basílica de São Sebastião são transmitidas ao vivo pela internet. Para o reitor e pároco, Frei Jorge de Oliveira, após as determinações das autoridades sanitárias, a fraternidade procurou se adequar às exigências com muita seriedade, fechando as portas das Igrejas, bloqueando os encontros pastorais e procurando a melhor forma de direcionar os funcionários e os frades, evitando toda forma de aglomeração, além de manter o distanciamento. Para ele, muitas pessoas vão buscar explicações fáceis para suas dúvidas e questionamentos que acometem todo o conjunto social. Segundo o frade, aí está o perigo, pois muitos oportunistas surgem na economia, na política e também na religião. Leia a entrevista a seguir.
Como o senhor vê essa pandemia que está dizimando muita gente em todos os países?
FREI JORGE – Não sou técnico na área da saúde nem cientista, mas como cidadão e também como homem de fé tento compreender o que se passa. Certamente que estamos em crise, mas já estávamos antes, e há muito tempo vivemos numa constante crise o que para mim não significa isolamento, fechamento ou descrença, mas que no fim desta longa travessia vislumbraremos a realização de tudo o que esperamos e lutamos por acontecer.
Existem correntes filosóficas ou simplesmente ideológicas que trabalham escondidas e manipulam dados que vão formar a consciência das pessoas. Tudo vai depender de onde estão as fontes onde bebo as informações e conteúdos e percebo que muitas delas são profundamente equivocadas, superficiais e frágeis, mesmo na linguagem e na experiência da nossa fé. Poderia dizer então que vejo esse momento como mais um tempo difícil, doloroso e complexo, mas dentro de um contexto de fragilização da pessoa e da própria humanidade.
Como os frades capuchinhos do Santuário Basílica de São Sebastião estão se precavendo contra a COVID-19?
FREI JORGE – Recebemos desde o inicio da quarentena e isolamento social orientação para entrarmos no ritmo que as autoridades sanitárias propuseram. Cada fraternidade procurou se adequar às exigências com muita seriedade, fechando as portas das Igrejas, escritórios, bloqueando os encontros pastorais, reuniões de equipes e procurando a melhor forma de direcionar os funcionários e os frades, evitando toda forma de aglomeração, mantendo o distanciamento, etc.
Lembro que a Província Nossa Senhora dos Anjos está presente nos Estados do RJ, ES e MG, o que exigiu um esforço muito grande para as devidas modificações. No momento estamos acatando as orientações das dioceses e sindicatos, sobretudo na questão dos funcionários, para que ninguém se sinta prejudicado. Nas fraternidades, continuamos com nossos momentos de oração em espaços arejados e mais abreviados, assim como estamos nos dedicando a todos os serviços como cozinha, limpeza, lavanderia, etc, já que os funcionários estão em suas casas, alguns em home office e nenhum deles em atividade trabalhista em seus postos normais.
Como alguns paroquianos estão perguntando sobre Frei João Carlos, como ele estava de férias na fraternidade de Santa Teresa (ES), foi melhor que permanecesse lá para evitar o seu deslocamento mesmo por automóvel. Estamos seguindo pausadamente e sem aglomeração de pessoas com a entrega das cestas básicas às famílias cadastradas e também realizamos a Campanha de Cestas Adicionais para as famílias das Crianças da Creche Chapeuzinho Marrom na comunidade do Turano.
Após a prestação de contas dessa campanha das cestas básicas cuja resposta foi mais um gesto de solidariedade e que pertence à Igreja, vamos estar fazendo contato pessoal com todos os dizimistas da Paróquia, obviamente reconhecendo as tantas dificuldades por que todos passam neste momento. Juntamente com a Secretaria Paroquial, a Equipe do Dízimo estará fazendo os contatos e orientando todos sobre devolução do dízimo e das necessidades que vão surgindo por parte dos pobres e fragilizados que são os mais atingidos pela pandemia. Muitas de nossas contas serão transferidas para os próximos meses, de acordo com a compreensão de todos.
Nas fraternidades, continuamos com nossos momentos de oração em espaços arejados e mais abreviados”
Há quem diga que o coronavírus é um castigo dos céus. O que o senhor acha?
FREI JORGE – Por que Castigo? Compreendo que em tais situações de tragédias, catástrofes, epidemias, e convulsões sociais fiquemos confusos, atordoados e inseguros. Muitas pessoas vão buscar explicações fáceis para suas dúvidas e questionamentos que acometem todo o conjunto social. Aí está o perigo, pois muitos oportunistas surgem na economia, na política e também na religião. São os interesseiros e charlatães, capazes de obter vantagens através do sofrimento e vulnerabilidade das pessoas para tirar proveitos próprios.
Até o fim do confinamento todas as celebrações estarão sendo transmitidas ao vivo pelas redes sociais da Basílica
Os preços sobem, os produtos somem, todos querem respostas e muitos falam do que não lhes compete. Uma das explicações fáceis e cruéis é a de que a pandemia é castigo de Deus e aí entramos nessa neurose de que o mal é a força vencedora e nos esquecemos que a graça de Deus é maior que tudo! O Aba, é o Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Papaizinho querido que nos criou e cuida de cada um e de cada uma de nós, e que nos ama com todas as nossas fragilidades e rejeições ao seus projetos de vida.
A Campanha da Fraternidade 2020 nos remete a essa compreensão de Deus que é a fonte da Vida que precisa ser por nós cuidada, por isso ela é dom – presente de Deus, de Graça e pela Graça, mas é também compromisso de onde podem estar surgindo nossas visíveis fragilidades. Nossos porquês somente vão encontrando respostas na medida em que nos deixemos tocar e conduzir por esse Deus Pai, misericordioso e que nos amou ao ponto de entregar o seu próprio Filho no alto de uma cruz, não mais como condenação mas somente como atitude de amor infinito de Deus que se debruçou sobre a dor e o drama da humanidade, ouviu o clamor do seu povo e veio em seu socorro.
Nesse momento de isolamento social e de cuidados sanitários individuais, vamos ocupar o tempo em nossas casas, não deixando a mente vazia”
A Cruz é a solidariedade de Deus com todos os que sofrem e morrem, amando-os até a loucura. Em Cristo crucificado se manifesta o amor incondicional de Deus, cheio de doçura em meio à catástrofe. Deus sofre e morre na Cruz. Deus assumiu a dor da humanidade em sua própria dor, assim como as infinitas injustiças da humanidade em sua própria e injusta condenação. Na agonia de Deus na Cruz, agonizaram os moribundos de todos os milênios. Na cabeceira da Cruz podemos colocar este titulo: Deus é amor, porque a dor e o amor se inverteram. Se levantarmos o véu da Cruz, veremos resplandecer espontaneamente o que foi o sentido da vida de Jesus, vivida em constante fidelidade a Deus, a sua missão e a favor dos sofredores. E o sentido de sua vida foi o amor, e esse amor responde à pergunta sobre o valor do sofrimento dos doentes” (cd Larranhaga, Frei Inácio, As forças da decadência, Paulinas, SP, 2005, pp 124-125).
Por isso amados irmãos e irmãs, nesse momento de isolamento social e de cuidados sanitários individuais vamos nos cuidar também do que vemos e ouvimos, vamos ocupar o tempo em nossas casas, não deixando a mente vazia porque o ditado popular já diz tudo “mente vazia é a oficina do mal”.
E nesse Tríduo Pascal, deixemo-nos alimentar na fé acompanhando nas redes sociais as celebrações e momentos fortes que nossa paróquia nos apresenta e que ‘’A esperança não decepciona e que nós nos gloriamos também nas tribulações, sabendo que a tribulação produz a perseverança, a perseverança produz a experiência comprovada, a experiência comprovada produz a esperança. E a esperança não decepciona, pois o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (RM 5).
Para Frei Jorge isso tudo vai passar. Ele conta que há cerca de 7 anos, durante uma noite de Natal em Mantena (MG) onde morava, uma enchente arrasou toda a cidade com cerca de dois metros de imundícies de toda espécie. Famílias inteiras de posses perderam tudo e viveram a experiência de contar com a solidariedade dos que tinham para doar alimentos, roupas e remédios por pouco que fosse. Estes foram capazes de abrir suas mãos e compartilhar naquela situação de tanta fragilidade com o frade e todas as pessoas a fé que nos leva a saber que Deus não abandona jamais seus filhos e filhas. Assim como hoje, não só a nossa, mas todas as igrejas de todas as confissões somos chamados a trabalhar de mãos dadas – instituições e governos, todos juntos.
“Permaneçamos firmes”, encoraja ele, “um novo dia vai raiar”. “E que Nossa Senhora dos Anjos interceda a Jesus por todos nós. Feliz e Santa Páscoa! Estamos unidos em oração e agradeço a todos e todas o esforço de juntos superarmos esse momento único na história da humanidade. Com muita saudade, mas unidos e fortalecidos pela fé, o meu carinho e agradecimento. Paz e bem!”
Por Emilton Rocha | Fotos: Frederico Araújo / Pascom
Fonte: Capuchinhos do Brasil /CCB
Por Frei Anderson Teodoro Aguiar Silva (Fraternidade São Sebastião)